Violência contra rádios comunitárias é sistemática, dizem associações
André Deak e Fabrício Ofugi
Repórter da Agência Brasil
06/01/2005
Brasília — O Estado brasileiro promove perseguições e violência sistemática contra as rádios comunitárias, afirmam instituições que trabalham com esses grupos. "Não apenas o número de rádios comunitárias que são fechadas está aumentando, mas a violência com que são fechadas aumenta também", afirma o uruguaio Gustavo Gómez, diretor do programa de legislação e direito à comunicação da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc).
A presidente do conselho de administração do Sindicato das Entidades Mantenedoras do Sistema de Radiodifusão Comunitária de São Paulo (Sinerc), Luci Martins, diz que "diante desse cenário de violência, a rádio comunitária vem tendo o mesmo tratamento que os criminosos de alta periculosidade. Por mais que deputado, [ativista de] direitos humanos, se manifeste, a Polícia Federal acha que está acima de qualquer poder".
Na mesma direção vão as críticas do coordenador geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e também secretário da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Celso Augusto Schroder. "Nós temos percebido (a violência contra as rádios) e várias vezes fizemos contato com a Anatel e com a PF pedindo outro tipo de atuação. Não estamos tratando de criminosos, contrabandistas, traficantes, nada disso. Ao contrário, estamos tratando de comunidades que precisam e necessitam produzir informação para se enxergarem no mundo, para construírem sua identidade e, com isso, interferir na identidade nacional."
Schroder concorda que "a lei tem que ser cumprida", mas diz que a Anatel deveria incluir um "componente social" em sua ação, que tivesse relação com as rádios comunitárias. "É óbvio que a PF e a Anatel têm a obrigação de cumprir a lei, mas achamos que é preciso licenciar as rádios imediatamente, para não dar a elas as mesmas características dadas aos criminosos comuns", diz.
De acordo com o coordenador jurídico da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), Joaquim Carvalho: "é um ato de violência sistemática, sim". Carvalho explica essa "perseguição" por meio de dois aspectos: em primeiro lugar, a questão financeira, "não porque a rádio comunitária compete pelos anunciantes com a rádio comercial; a questão é de audiência: os patrocinadores já não querem os valores propostos anteriormente, por causa da redução da audiência – que migra para as comunitárias". Em segundo lugar, ainda de acordo com o coordenador da Abraço, viria a questão política: "As rádios comerciais, na história do Brasil, têm servido como moeda de troca do governo para votações dentro do Congresso. No RS, quando se fala em rádio comercial, pergunta-se logo qual é o deputado que está vinculado, qual é sócio".
Chefe da Delegacia Regional de Combate ao Crime Organizado (DRCOR), o policial federal Francisco Moura Velho diz que muitas pessoas não têm noção do que seja um mandado de busca, e por isso se assustam. "Caso a pessoa não permita a entrada, a Justiça dá amplos poderes, autoriza até você derrubar a porta, e às vezes as pessoas não entendem. Acham que o policial não precisava estar armado, o camburão parado lá embaixo - o que o vizinho vai pensar? Na verdade, essa é a forma correta. E a pessoa pode até ser algemada em flagrante delito", diz.
Em relação às acusações de que a polícia utiliza a mesma força contra criminosos perigosos e proprietários de rádios, Moura diz que "não se pode nem comparar". "Não dá para dizer que quem tem uma rádio vai ser tratado da mesma forma que um traficante, onde se leva armas mais pesadas e um número de policiais bem maior", diz. Até mesmo porque, segundo ele, "não existe qualquer resistência, mesmo porque boa parte (no DF) está vinculada a programas religiosos, e são pessoas que não tem qualquer folha de antecedentes criminais".
"São pessoas que querem fundar uma associação e infelizmente colocam a rádio no ar sem autorização. Quando se deparam com a polícia, no geral cooperam. Mas sabem que estão infringindo a lei, então dificultam a fiscalização da Anatel, mudando a rádio de lugar. Quando se emite um mandado, muitas vezes a rádio já não está mais lá", conta.
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