Confronto em desocupação na Anatel no RS gera troca de acusações e denúncia na Câmara
André Deak
Repórter da Agência Brasil
06/01/2005
Brasília — "Quando tentei dissuadir policiais que estavam espancando um jovem militante, o agente, em tom elevado, respondeu: ‘Não te mete que vai sobrar pra ti. Aqui você não manda nada. Você pode mandar alguma coisa na Câmara. Aqui quem manda somos nós’". As declarações, do deputado federal Adão Pretto (PT-RS), fazem parte do relatório enviado para a Corregedoria da Câmara no dia 14 de dezembro, a respeito das supostas agressões da Polícia Federal durante a manifestação que ocupou a sede regional da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) no Rio Grande do Sul, no dia 26 de novembro de 2004.
"O papel aceita tudo. Essas alegações, absolutamente, não procedem", garante o superintendente da PF no RS, Rubem Albino Fockink. "Na verdade, na ocasião, os agredidos foram os policiais – a polícia não procura provocar tumultos, mas apaziguar. Tenho laudos do IML de policiais feridos, um deles com oito pontos na cabeça. Nenhum deles da marcha apresentou qualquer tipo de lesão. A versão do deputado é apenas a versão de um dos lados. Os documentos que estão sendo coletados poderão provar o contrário", diz.
O coordenador jurídico da Associação Nacional de Radiodifusão Comunitária (Abraço), Joaquim Carlos Carvalho, também aparece no relatório como tendo sido agredido. Ele conta que "prenderam e surraram esse rapaz do movimento dos catadores, e antes de ele entrar no presídio, fizeram um exame de corpo-delito". Carvalho, que alega ter sido agredido também, disse que se recusou a fazer o exame, assim como outros colegas, porque julgaram que a culpa não foi dos policiais que praticaram a agressão: "São trabalhadores e seriam responsabilizados pela má conduta de um delegado. Isso ia estourar no policial federal, e não no comandante da operação".
De acordo com a versão de Carvalho e do deputado Adão Pretto, cerca de 300 manifestantes ligados ao movimento de rádios comunitárias foram à sede da Anatel cobrar explicações do diretor regional sobre supostas irregularidades na fiscalização. Pretto conta que "todos os funcionários tiveram garantida a possibilidade de realizar suas atividades normais como também a de desocupar o prédio", e que, inclusive, "no momento se realizava concorrência pública que não foi suspensa com a ocupação".
Sobre o ferimento do policial, tanto o advogado da Abraço como Pretto dizem que foi um acidente, causado pelos próprios agentes da PF. O advogado da Abraço diz que a PF chegou no local com ameaças de bombas de gás. "Foi então feita uma negociação entre os deputados e a PF: sairia uma comissão de dez pessoas para negociar a saída pacífica dos manifestantes, sem que a polícia entrasse. Eu fui o último desse grupo a sair e, atrás de mim, a PF descumpriu esse acordo tentando invadir o prédio. O pessoal, que usava uma taquara como bandeira, tentou usar a taquara como alavanca para impedir a porta de se abrir, e quando o policial empurrou a porta, a taquara quebrou e bateu na cabeça dele", conta.
Em seguida, Pretto conta que viu sete policiais partirem para cima de um trabalhador do movimento dos catadores de lixo: "Um pisava nas costas, outro nas mãos, outro tentava algemar, outro batia com um pedaço de pau na cabeça. Pedi que parassem, mandaram que eu recuasse porque ia sobrar pra mim, que ali quem mandava eram eles e que ninguém é superior a eles".
O assessor de imprensa do deputado estadual Dionilso Marcon (PT-RS), Kiko Machado, que também estava presente, publicou uma nota dizendo que também foi agredido na ocasião e que "com base nos registros fotográficos do jornalista, os agredidos moverão um processo contra a PF".
De acordo com a versão do delegado Fockink, "os policiais foram solicitados pela Anatel, que foi invadida com violência, portas quebradas e pessoas mantidas em cárcere privado. O policiais chegaram e foram repelidos, com violência que provocou lesões. Bandeiras serviram de armas de agressão, na tentativa de impedir que os policiais ingressassem na garagem. Nossos policiais tiveram muita tranqüilidade e bom senso e, apesar de agredidos, não responderam no mesmo padrão", afirma. O delegado diz ainda que "com certeza, qualquer pingo de sangue que fosse vertido do outro lado seria usado como uma grande bandeira", e que "políticos tentam, aqui e acolá, capitalizar essas questões, o que é compreensível. O senhor Adão Pretto não foge à regra. Mas o ônus da prova cabe a quem acusa".
Pretto disse à Agência Brasil que estava alarmado com a brutalidade da Polícia Federal na ocasião. "Há mais de 20 anos que estou nessa luta, sou um dos fundadores do PT, do MST, já estive muitas vezes em conflitos com a polícia militar, mas nunca vi uma polícia tão violenta como a PF durante a intervenção na Anatel de Porto Alegre, onde fui desrespeitado, agredido verbalmente e até fisicamente. Fui ameaçado, inclusive, e vi a polícia praticar banditismo contra trabalhadores desarmados. Tenho dezenas de testemunhas que comprovam isso", declara.
Uma nota emitida pela Comunicação Social da Superintendência da PF no Rio Grande do Sul logo após o incidente afirma que "cerca de 50 pessoas ligadas à Associação de Rádios Piratas invadiram o prédio no início da manhã e exigiam a liberação de equipamentos de rádio pirata apreendidos pela Agência. Ao chegarem (...), os policiais federais foram recebidos pelos invasores com agressões físicas, inclusive pauladas. (...) O confronto resultou em quatro policiais federais com lesões corporais, que receberam atendimento médico, e um invasor preso".
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