Música brasileira nas ondas do rádio
Aline Macário
Música brasileira nas ondas do rádio foi o tema discutido na mesa-redonda entre Aquiles Reis, integrante do grupo MPB4, e os profissionais das rádios educativas de Bauru Fábio Fleury, da Unesp FM, e Lígia Almeida, da Veritas FM. O evento faz parte do seminário Onda Cidadã: Radiodifusão, Cultura e Educação, realizado na Universidade do Sagrado Coração (USC), em Bauru (SP), promovido pelo Itaú Cultural, com o apoio da USC e da OBORÉ Projetos Especiais.
“Esta Onda Cidadã é uma iniciativa importante para que o rádio se recupere como agente cultural”, ressaltou Aquiles. Ele citou que, antes do surgimento da televisão, o rádio era o meio de comunicação responsável pelo conhecimento das pessoas acerca de suas realidades, mas foi perdendo o prestígio.
O debate também girou em torno do compromisso do rádio com a cultura e a educação musical, diante das diferenças entre o que foi denominado por Fleury como “Música Perecível Brasileira” e “Música Perene Brasileira”, ao fazer uma comparação com a sigla MPB. Para ele, esta última está relacionada a músicas que marcam épocas e que não deixam de ter sucesso entre as gerações seguintes. Isso não ocorre com as músicas perecíveis, que geralmente atingem vendagens extraordinárias, mas não passam de modismos, logo substituídos por outros.
Fleury levantou a questão da postura comercial assumida pelas rádios no contexto capitalista. Ele acredita que as emissoras devem agir de acordo com as regras do mercado para sobreviver, mas que atualmente há o exagero de se querer ganhar dinheiro às custas da depreciação do gosto popular. “Não existe esse negócio de dar ao povo o que o povo quer. A gente tem que mostrar algo que o povo é capaz de querer. E o rádio é um grande instrumento para isso”, disse.
Apesar de ressaltar que o gosto musical é subjetivo, Fleury disse que a ideologia capitalista acaba transformando músicas ruins em produtos de consumo de massa devido ao recurso da repetição.
Aquiles complementou a idéia ao dizer que toda música nasce para ser perene e que se torna perecível devido à adaptação que se faz dela, buscando a reprodução de um produto massificado, que tem vendagem garantida. “A culpa é dos diretores artísticos, e não do músico, que só quer trabalhar. As gravadoras usam o músico e depois cospem”, opinou ele.
Neste sentido, Fleury compara as rádios comerciais, que têm o objetivo de vender produtos, com as emissoras educativas, que devem vender idéias e conhecimento. Para Aquiles, as rádios educativas e comunitárias podem colaborar para a quebra do chamado “jabá”, expressão que denomina a prática das emissoras comerciais de vender espaço para as grandes gravadoras.
A partir disso, foram debatidos os limites das emissoras educativas e comunitárias, que devem ter como essência o incentivo à cultura, à educação e à promoção da cidadania, abrindo espaço para produções de qualidade, feitas sobretudo por artistas inéditos. Aquiles acredita que discussões como esta podem abrir caminhos para que as rádios dêem preferência à música perene. “Nós somos um povo musical. Como ficamos muito tempo afastados disso, esta Onda Cidadã vai ser um trabalho lento e gradual”.
Ele também falou sobre as dificuldades enfrentadas pelos músicos, que precisam ter criatividade não só para cantar, compor e fazer arranjos, mas também para encontrar meios de distribuir seu material e torná-lo conhecido. Durante sua intervenção, Aquiles deu a idéia de que grandes bancos exercessem o papel de agentes da cultura. Desta forma, agências bancárias poderiam se transformar em pontos de venda de produtos culturais.
Essa proposta foi complementada por Sérgio Gomes, diretor da OBORÉ e mediador do debate. Ele sugeriu que fossem promovidos encontros destinados a gerentes de bancos, para que eles sejam conscientizados da sua capacidade de se transformar em agentes culturais.
Sérgio também deu a sugestão de que a USC realize um seminário específico sobre música, e incentivou a criação de parcerias entre rádios comunitárias, músicos e gravadoras independentes, com a finalidade de divulgar produtos culturais.
O debate também teve grande participação da platéia, formada, de um modo geral, por alunos do curso de pós-graduação da USC, estudantes de jornalismo e profissionais da área de rádio. Os presentes insistiram para que o evento fosse encerrado com uma canção interpretada por Aquiles Reis. O músico pediu ajuda à platéia e foi atendido. Iara Pasqualini, aluna de jornalismo da USC, portadora de deficiência visual, cantou a música “O bêbado e o equilibrista”, de Elis Regina, e foi acompanhada por um côro emocionado. Em seguida, Aquiles presenteou o público com uma canção de Nelson do Cavaquinho. “É a música que eu canto para minha filha Isabel, que tem 19 dias, dormir”, disse.
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